quarta-feira, 21 de setembro de 2016

ARTIGO: O que há de tão perigoso?

Mas o que há, enfim, de tão perigoso no fato de as pessoas falarem e de seus discursos proliferarem indefinidamente? Onde, afinal, está o perigo?, assim falou Michel Foucault no Collège de France, em 1970, que deu origem ao livro “A ordem do discurso”. Proferida há quase cinco décadas; todavia, atemporal.

O ato de discursar, seja através das palavras, gestos, imagens ou até pelo próprio silêncio, é uma atividade inerente ao “estar vivo”. Ao nascer, discursar é a primeira coisa que fazemos: choramos. E se não choramos, somos forçados a isso.

Cotidianamente, empregamos os nossos corpos e mentes na realização de infinitos discursos, desde aqueles que têm como escopo o atendimento de necessidades básicas até os que visam à irrupção de opiniões.

O discurso é também uma forma de exercer/defender o poder; para tanto, munindo-se das mais diversas artimanhas: popularidade, inverdades fantasiosas, recursos gráficos, aparato financeiro etc. “[…] o que está em jogo senão o desejo e o poder?”, disse Foucault.

Será, por esse motivo, tão perigoso o discurso? Em tempos como esses, de campanha eleitoral – digo, em que os mais diversos discursos tomam formas, os sujeitos inseridos acabam utilizando variados mecanismos de comunicação para defender o que é seu: a sua opinião e ‘opiniões’.

Todavia, aquele que fala, especialmente o que tem o poder da fala (ou do discurso) em relação a um grande número de pessoas, possui também o dever com a verdade, a obrigação da honestidade com aquele que lê e escuta. A verdade não pode, nesse caso, atender ao “desejo” daquilo que se quer ter como verdadeiro, mas à realidade. É, nesse ponto, que esbarramos com a dualidade existente dentro da liberdade de expressão: verdade versus mentira.

Até onde a defesa de uma opinião não ultrapassa os limites, rompendo com a verdade? Até onde se pode utilizar de princípios constitucionais distorcidos para a defesa da manutenção de um poder? Até onde se pode falar? O que se pode falar?

Essas questões deveriam ser pauta obrigatória para aqueles que se debruçam nas teclas de um objeto de comunicação e proferem discursos violadores da boa-fé. Pois, esquecem que todo direito dado pelo ordenamento jurídico vem conjugado com um dever.

E o dever é a responsabilidade de falar o fato real, exatamente como ele é. A consciência, nesse caso, não deve atingir apenas a moral individual, de estar traindo a si próprio, mas, sim, coletiva; pois os discursos, como enfatiza Foucault, se proliferam indefinidamente e sujeitam pessoas, lares e opiniões. 
Vale lembrar, como disse o multidisciplinar: “É sempre possível dizer o verdadeiro no espaço de uma exterioridade selvagem”.

(Brena Santos – Advogada)

Coluna do dia – 18 de setembro de 2016

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